Desde há muito tenho me debruçado sobre a origem do meu sobrenome. Perguntado, meu pai Kaoru me explicou que Katsurayama significava uma espécie de cipó (katsura) da montanha (yama). Não soube me dar mais detalhes. Como perdi o meu avô paterno muito cedo, não me restou senão a singela definição paterna.
Assim, por muito tempo, satisfiz minha curiosidade e deixei a vida seguir em frente. Todavia, com o advento da internet e sites de busca, retomei as minhas pesquisas e consegui juntar uma série de novas informações interessantes. Descobri inicialmente que o ideograma japonês que representa a primeira parte está mais para kudzu – realmente uma espécie de erva trepadeira com interessantes componentes medicinais e muito agressiva em seu crescimento, sufocando outras plantas, cobrindo com suas ramas árvores, casas e construções. É conhecida como “araruta japonesa ou chinesa”, largamente conhecido no sudeste asiático.
Consta que na Exposição Mundial de Chicago, em 1893, um evento de impacto internacional, a delegação japonesa teria levado algumas mudas de kudzu para ofertá-las às autoridades estadunidenses, mas que foram descartadas descuidadamente após o evento, o que resultou, após alguns anos, numa rápida multiplicação dessa erva invasora nas proximidades do Parque de Exposições. Essa trepadeira espraiou-se por todas as partes dos EUA e hoje existe uma variedade enorme de kudzu em todo o solo americano.
Qual, então, foi a conexão dessa planta com o nome da minha família? Ora, acontece que por volta de 1550, o Japão ainda estava por se unir. Diversos senhores feudais – os chamados daimios – alguns poderosos, outros menos, se digladiavam para conquistar territórios e manterem supremacia uns sobre os outros. A terra dos meus ancestrais se localizava ao norte da Província de Shinano, na parte oeste do monte Zenko-ji e ao norte do rio Susohanagawa, onde erigiram, em 1553, um castelo estratégico, feito de madeira e de difícil acesso. Era um enclave que impediu o avanço do exército de Takeda Shingen por um bom tempo. Tornou-se com o tempo um aliado precioso para o daimiô Uesugi Kenshin – outro poderoso senhor da Província de Shinano e arqui-inimigo de Takeda Shingen. Dizem que próximo ao castelo Katsurayama havia uma floresta densa, coberta de kudzu por todos os lados. Infelizmente em 1557, nevou tardiamente naquele ano, o que impossibilitou Uesugi de enviar tropas de apoio ao castelo Katsurayama, quando então um exército de 6.000 homens de Takeda Shingen cercou e tomou de assalto a fortaleza que, mesmo sitiada, resistiu bravamente, mas sucumbiu ao final.
Muitos dos defensores morreram em combate, enquanto os familiares dos nobres cometeram suicídio em massa – como era o costume à época. O alto escalão foi decapitado e restaram somente os servis mais humildes que foram deportados para outras regiões distantes. O castelo foi demolido e incendiado, restando hoje apenas um marco histórico no local. Uma leva de deportados foi para a longínqua ilha de Hokkaido e outra para a região de Kumamoto, levando consigo o sobrenome Katsurayama como herança.
Os meus antepassados são os que foram para Hokkaido, onde se estabeleceram ao norte daquela ilha, próximo à região muito fria de Shibetsu, como lavradores e plantadores de arroz. Meus avós imigraram para o Brasil por volta de 1918, fugindo do frio e da fome. A primeira parada foi na Fazenda Guatapará, bairro de Mombuca, onde se juntaram a outros imigrantes na colheita do café. Quando reuniram alguns recursos, se mudaram para a zona rural de Avencas, na época subdistrito de Marília (SP), onde plantaram algodão e ganharam muito dinheiro. Com essas economias adquiriram terras na Alta Paulista, no nascente distrito de Califórnia (hoje cidade de Osvaldo Cruz) com o objetivo de plantar café e se estabelecer definitivamente no Brasil. Dali os filhos e netos se espraiaram para outras localidades, primeiro para a cidade – onde os filhos e filhas pudessem estudar em melhores escolas, e, depois para outras cidades como: Vera Cruz (SP), Naviraí (MS), Ponta Porã (MS), Taubaté (SP), Pindamonhangaba (SP), Toledo (PR) e São Paulo (SP).
Atualmente temos Katsurayamas pelo Brasil todo: Manaus (AM), Rio de Janeiro (RJ), Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Frei Rogério (SC), São Joaquim (SC), Ivoti (RS), São Leopoldo (RS), Indaiatuba (SP), Mogi das Cruzes (SP) e muitas outras cidades e no exterior (Cingapura, onde mora atualmente o meu filho Paulo Ossamu com a família). Com o advento da internet pude estabelecer contatos com residentes no México (San José del Colorado), nos EUA, no Japão e no sul do Brasil (Curitibanos-SC), expandindo a rede de conhecidos que possuem o mesmo sobrenome. Conheci também outros Katsurayamas, em São Paulo e Campinas, mas que não têm no sobrenome o mesmo ideograma.
Por fim, devo salientar que outros sobrenomes parecidos que têm a raiz kudzu, como Kudzuyama, Kuzuyama, Kazurayama e semelhantes podem fazer parte da mesma ancestralidade.
Trata-se de uma amostra de parte de nossa história e de sua origem que tento registrar para todos os Katsurayamas, com o objetivo de levar um pouco de luz aos que se interessarem em conhecer suas raízes e suas origens nipônicas.
© 2024 Thoshio Katsurayama
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