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Meu pai foi um resistente do Tule Lake

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A família do meu pai em 1926. Ele pode ser visto na extrema direita.

Eu sempre vou admirar a força e a coragem do meu pai. Apesar dos tremendos desafios que enfrentou quando era um jovem internado nos campos de encarceramento dos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial , ele viveu a sua vida com garra e perseverança.

Meu pai nasceu em Santa Ana, na Califórnia, em 6 de junho de 1921; era filho de pais imigrantes que tinham uma bem-sucedida plantação de aipo. Aos 5 anos de idade, ele retornou ao Japão com os seus pais para cuidar do avô doente e acabou ficando por lá o resto da sua infância. Muitos anos depois, a minha avó me contou como ele era inteligente e estudioso, e que ainda por cima era um líder nato. Em 1939, ele se formou com honras na prestigiosa escola do ensino médio Kenritsu Yawatahama e aceitou um estágio no Sumitomo Bank em Los Angeles. Após a sua mudança para o sul da Califórnia, ele conheceu outros Kibei-Nisei – nipo-americanos nascidos nos EUA, mas criados no Japão. O futuro parecia brilhante.

O ataque em Pearl Harbor em dezembro de 1941 alterou radicalmente a vida dos nikkeis – aqueles indivíduos de descendência japonesa. Três meses depois do ataque, o presidente Franklin D. Roosevelt assinou a Ordem Executiva nº 9066, autorizando o encarceramento dos 120.000 japoneses que moravam na costa oeste dos EUA, dois terços dos quais eram cidadãos americanos. Meu pai foi enviado à força para o Campo de Encarceramento de Manzanar, localizado logo a oeste do Death Valley [deserto na Califórnia, perto da fronteira com Nevada].

Meu pai trabalhava na oficina de conserto de máquinas de costura no Campo de Encarceramento de Manzanar. Ele está na fileira de trás, o segundo da esquerda.

Por trás do arame farpado no meio do deserto, o seu sonho de seguir uma carreira bancária foi completamente destruído. Como era um jovem de 20 anos sem família nos Estados Unidos, ele deve ter se sentido muito sozinho e traído.

Em 1943, o questionário conhecido como o “Pedido de Permissão de Saída” foi entregue a todos os adultos nos campos de internamento. Criado pela Autoridade de Relocação de Guerra dos EUA, o questionário incluía duas perguntas sobre lealdade: as Perguntas 27 e 28, as quais levaram a sérios conflitos e distúrbios entre os japoneses que viviam nos campos.

A pergunta 27 dizia: Você está disposto a servir nas forças armadas dos Estados Unidos em zonas de combate, onde quer que você seja enviado?

A pergunta 28 dizia: Você jura completa lealdade aos Estados Unidos da América e promete defender fielmente os Estados Unidos contra todo e qualquer ataque de forças estrangeiras ou domésticas, como também renuncia a qualquer forma de lealdade ou obediência ao imperador japonês e a qualquer outro governo, poder ou organização estrangeira?

Isso gerou confusão e protestos em massa.

Será que um “Sim” à pergunta 27 queria dizer que os homens nisseis seriam convocados para o exército americano enquanto que, ao mesmo tempo, eram mantidos atrás de arames farpados?

Será que um “Sim” à Pergunta 28 poderia indicar que os imigrantes isseis se tornariam apátridas e, como consequência, acabariam sendo separados dos filhos nascidos nos Estados Unidos?

Muitos, como o meu pai, protestaram e, enfurecidos, se recusaram a responder estas perguntas ambíguas – ou responderam “Não” às duas. Marginalizados e rotulados como os “rapazes do não-não” (mais tarde conhecidos como os Membros da Resistência de Tule Lake), eles foram posteriormente enviados ao Centro de Segregação de Tule Lake, numa região desolada no norte da Califórnia.

Tempos depois, em um ensaio pessoal intitulado “Errante de Campos de Detenção”, meu pai descreveu a sua experiência:

“Aqueles considerados desleais eram segregados no campo de Tule Lake. Como eu havia pedido para ser enviado de volta ao Japão, eu já estava na lista negra. Fiquei sem responder as perguntas de lealdade em Tule Lake. Tule Lake havia sido construído para abrigar 10.000 pessoas, mas 18.000 estavam amontoadas lá dentro. De todos os atos raciais discriminatórios cometidos pelos Estados Unidos, eu me lembro deste como o pior.”

Como resultado do bombardeio atômico americano em Hiroshima e Nagasaki, a Segunda Guerra Mundial chegou ao fim em agosto de 1945. O Centro de Segregação de Tule Lake foi fechado no ano seguinte. Meu pai foi então enviado para um campo de encarceramento em Crystal City, no Texas, junto com outros Membros da Resistência de Tule Lake. Ele descreveu a sua chegada:

“Logo que chegamos, nos deram números que eram então fixados no nosso peito. Não só isso, mas também fomos levados à guarita para que nos revistassem em busca de contrabando. Fomos forçados a nos despir para a inspeção. Ainda me lembro de gritar com o soldado, que tinha mais ou menos a minha idade: 'Você acha boa ideia apontar uma baioneta armada para um outro americano?'”

Em 1947, meu pai foi enviado para trabalhar na Seabrook Farms, uma empresa de alimentos congelados sediada em Nova Jersey. Mais tarde naquele ano, o Departamento de Justiça ordenou a libertação de todos os detidos nikkeis. Meu pai sentiu o gosto da liberdade pela primeira vez em mais de cinco anos.

Eu me lembro de perguntar ao meu pai por que ele resolveu não retornar ao Japão para se juntar à sua família. Ele respondeu que, apesar dos anos terríveis passados no campo de internamento, ele queria ver aonde a sua vida nos Estados Unidos o levaria. Pouco tempo depois ele se estabeleceu em Pasadena, [no Condado de Los Angeles] na Califórnia, onde conheceu a minha mãe e acabou formando uma família. Na sua opinião, já era tarde demais para cursar a universidade ou iniciar uma carreira bancária. Devido ao preconceito contra japoneses no período pós-guerra dos anos 50, era difícil encontrar trabalho. Por isso ele teve que se virar como jardineiro, trabalhando por conta própria durante os 40 anos seguintes. Ele se tornou um membro proeminente da comunidade nipo-americana, conquistando posições de liderança na Associação de Jardineiros do Sul da Califórnia, no Ehime Prefecture Club e no Kokuseiryu Shigin. (Shigin é uma forma de cantar poemas clássicos japoneses.)

Meu pai raramente falava sobre os seus anos de encarceramento. Eu acho que era algo muito doloroso. De vez em quando, eu escutava as suas conversas com os seus amigos Kibei-Nisei. Acontecia dele ouvir alguma coisa no noticiário que trazia à tona as suas experiências no campo de internamento e o deixava enfurecido. Não sei se ele conseguiu perdoar os Estados Unidos pelo que foi feito contra os nipo-americanos. Mas sei que ele nunca se esqueceu.

Meu pai faleceu em 2016 aos 94 anos de idade. Ele continua a ser a minha inspiração.

É interessante notar que, nos 75 anos desde a Segunda Guerra Mundial, nunca nenhuma pessoa de descendência japonesa foi condenada por qualquer ato de espionagem ou sabotagem.

 

* Esta é a história favorita do Nima-kai para a série Heróis Nikkeis.

 

© 2019 Keiko Moriyama

Os Favoritos da Comunidade Nima-kai

Todos os artigos enviados para esta série especial das Crônicas Nikkeis concorreram para o título de favorito da nossa comunidade. Agradecemos a todos que votaram!

84 Estrelas
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Sobre esta série

A palavra “herói” pode ter significados diferentes para pessoas diferentes. Nesta série, exploramos a ideia de um herói nikkei e o que isso quer dizer para cada pessoa. Quem é o seu herói? Qual é a história dele? Como ele(a) influenciou sua identidade nikkei ou a conexão com sua herança cultural nikkei?

Aceitamos o envio de histórias de maio a setembro de 2019; a votação foi encerrada em 12 de novembro de 2019. Todas as 32 histórias (16 em inglês, 2 em japonês, 11 em espanhol, e 3 em português) foram recebidas da Austrália, Brasil, Canadá, Estados Unidos, Japão, México e Peru. Dezoito dessas submissões foram de colaboradores inéditos do Descubra Nikkei!

Aqui estão as histórias favoritas selecionadas pelo Comitê Editorial e pela comunidade Nima-kai do Descubra Nikkei.


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About the Author

Keiko Moriyama nasceu e foi criada em Los Angeles. Ela deixou para trás uma carreira no ramo de marketing no setor de tecnologia e mergulhou no mundo da literatura de viagens. Seu ensaio sobre o Marrocos foi publicado recentemente na antologia Deep Travels: Souvenirs from the Inner Journey (“Viagens Profundas: Souvenirs da Jornada Interior”). Sendo uma ávida viajante, ela gosta de blogar sobre as suas aventuras e atualmente está obcecada em explorar os vários bairros de Tóquio. Ela mora em Las Vegas com o marido e um gato ruivo.

Você pode seguí-la no Twitter e Instagram.

Atualizado em setembro de 2019

   

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