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Suzano se orgulha por ser o berço do Yakisoba – Pastifício Hirotani e Bunkyo juntos na divulgação pelo Brasil

O Yakisoba caiu no gosto do brasileiro

O Yakisoba partiu da “koronia”¹ para o Brasil todo e hoje é grandemente apreciado pelos brasileiros. Mas se for comparar o Yakisoba dos dois países, por que no Japão o mais consumido é o Sauce Yakisoba (macarrão soba frito), enquanto no Brasil é aquela porção generosa de carne e legumes com denso molho por cima? Esse enigma era tão difícil de elucidar como se fosse uma das “Sete Maravilhas da Colônia”. No entanto, por trás disso estavam o Pastifício Hirotani Seimei de Suzano em estreita colaboração com a Associação das Senhoras do Bunkyo local no intuito de angariar fundos para a manutenção do Kaikan. Visitando Suzano, considerado o berço do Yakisoba, pude ouvir a história que nem todos conhecem sobre a popularização desse prato.

Hoje em dia, percorrendo os bares populares da região da Praça da Sé e Anhangabaú, no centro da cidade de São Paulo, vê-se que o YAKISOBA aparece em destaque no cardápio.

Enquanto pratos requintados como Sushi e Sashimi sãoservidos em restaurantes para brasileiros abastados e de classe média, o Yakisoba tornou-se popular entre os motoqueiros e estudantes de poucos recursos, portanto, são da mesma origem, mas com características diferentes. São todos pratos representativos da culinária japonesa por assim dizer.

Como o Yakisoba é um tipo de macarrão, tinha condições para ser aceito facilmente, mas, para o brasileiro não familiarizado com a comida japonesa, o molho com sabor acentuado de shoyu e muito doce deve ter sido “algo um tanto diferente”. Seria mais natural que o Sauce Yakisoba tivesse tido mais aceitação, mas se o Ankake Yakisoba tornou-se popular, é evidente que alguém deve ter se movimentado para isso acontecer. Tem de haver um motivo.

Anos atrás, um jornalista nosso que estava atrás dessa resposta, foi cobrir o Festival do Sukiyaki que o Bunkyo de Suzano estava realizando e ouviu de um funcionário a seguinte história: “O Ankake Yakisoba começou aqui em Suzano”. Por ocasião do 109º aniversário da imigração japonesa fui a Suzano com a convicção de que essa história deveria registrada.


Por que o Ankake Yakisoba tornou-se popular

Dia 8 de junho eu cheguei no Bunkyo de Suzano à tarde, onde cerca de 20 senhoras da Associação “Haha no Kai” (Clube das Mães) estavam reunidas para o almoço que acontece semanalmente.

Enquanto todo mundo se divertia jogando bingo e baralho, perguntei à presidente da Associação de Senhoras, a nissei Takeko Yonamine de 86 anos, se é verdade que Suzano é o berço do Yakisoba. “Foi mais de 40 anos atrás, quando o atual Kaikan nem tinha sido construído. Começou com o sr. Hirotani do pastifício ensinando como preparar Yakisoba para o grupo de senhoras. Até então ninguém do lugar tinha visto um prato de Yakisoba”, falou com fluência.

Naquele momento, este jornalista sentiu-se como um garimpeiro que descobre um veio na mina de minério.

O Pastifício Hirotani Seimei fica em Suzano e seu fundador exerceu o cargo de presidente do Bunkyo também e é uma pessoa que tem envidado esforços em prol da sociedade nikkei da região. Originalmente, a família possuía um pastifício no Japão e foi lá que aprendeu como se prepara o Yakisoba. Assim, foi para expandir os pontos de venda que começou a transmitir os ensinamentos às senhoras da associação.

(da esq.) srª Yoshida e sr. Takagi

Segundo a presidente Sadako Yoshida (74, nissei), desde o início o tipo foi Ankake Yakisoba, com o macarrão servido com molho denso. Ela acha que para o gosto dos brasileiros teria de ser um prato quente, porque “se for do tipo Ankake é possível conservar a temperatura por mais tempo”.

Além do que, o preparo do Sauce Yakisoba necessita de um número determinado de horas para fazê-lo por completo e o molho Worcestershire (molho inglês) que é usado em grande quantidade, não era amplamente conhecido na coletividade nipo-brasileira 40 anos atrás.

Por outro lado, o Ankake que leva muitos ingredientes é preparado com antecedência, bastando esquentá-lo na hora, colocar por cima do macarrão já frito e assim o cliente é servido com rapidez. Quanto aos ingredientes, já eram consumidos de maneira geral na comunidade nikkei naquela época. Além disso, o custo do repolho, cenoura e cebola é zero, pois o Bunkyo conta com um grande número de sócios que são agricultores e que contribuem doando esses ingredientes.

Nos eventos do Bunkyo fica claro que servir o Ankake Yakisoba nas barracas é mais racional. É de se supor que, graças à ideia inicial das senhoras e à comunicação boca a boca feita na comunidade, o tipo ankake foi se difundindo cada vez mais.

A associação “Haha no Kai” começou as atividades em 1955 com 8 membros e uma das sócias fundadoras, a srª Masako Kondo, iniciou a venda de Yakisoba nos eventos a fim de angariar fundos para a manutenção do Kaikan e, para isso, contou com a colaboração do Pastifício Hirotani Seimei. A presidente srª Yoshida relembra com saudades: “Em Suzano, onde a “koronia” é grande, desde aquela época os brasileiros também apreciavam a comida japonesa como onigiri e tsukemono. Foi por isso que o Yakisoba tornou-se popular desde o começo”.

E prosseguiu para falar da larga aceitação do Yakisoba: “Além do mais, os brasileiros não consomem legumes em quantidade. Acho que por isso aceitaram bem o prato que leva carne e bastante legume. Mesmo as crianças brasileiras que não comem legumes, se for no Yakisoba elas comem com alegria”.

Yakisoba do Guifu Kenkinkai do Brasil (março de 2010)


Crescendo juntos e transmitindo conhecimentos

Depois disso, o sr. Mitsue Miyazato, membro do Bunkyo, trouxe mudas de cerejeira de Okinawa e plantou-as em Suzano, o que resultou numa belíssima floração, 32 anos atrás.

Assim, teve início o Festival da Cerejeira que se tornou um grande acontecimento na região e o Yakisoba passou a ser servido lá. “A cada ano que passa em escala cada vez maior. Hoje em dia a grande maioria dos visitantes é de brasileiros (não descendentes). Em 2 dias são consumidas aproximadamente 6 mil refeições” – exclama com alegria.

O Pastifício Hirotani Seimen também veio se expandindo através dos tempos. Começou como uma pequena indústria da família na própria residência até possuir uma grande fábrica. “A esposa foi também presidente do ‘Haha no Kai’ e o casal se empenhou em prol do Bunkyo. Lembro que antigamente faziam as entregas aqui e acolá de bicicleta”.

Com a popularização do Yakisoba graças ao Festival da Cerejeira, outros grupos nikkeis começaram a manifestar interesse. Então, voluntárias da Associação de Senhoras visitaram a Ipelândia Home – unidade do Enkyo (Beneficência Nipo-Brasileira de São Paulo) – e também localidades que organizam eventos como Campos do Jordão, a fim de ensinar o preparo do Yakisoba.

Shizuho Nishioka, 78, nissei, conta sobre as dificuldades: “Não somente os ingredientes, mas tínhamos que levar tudo, de facas a panelas”. As voluntárias ajudaram até cada grupo se tornar independente.

No Bunkyo de São Joaquim, Santa Catarina (março de 2013)


Yakisoba, o orgulho de Suzano

O Yakisoba, cuja receita foi transmitida pelo pastifício ao Bunkyo de Suzano logo se difundiu para grupos nikkeis de várias localidades e, assim, um número cada vez maior de brasileiros veio a conhecê-lo. Hoje em dia, além de ser vendido em food truck de comerciantes chineses, esse prato consta no cardápio dos restaurantes de comida chinesa. Em outras palavras, o Yakisoba está se tornando um prato popular do Brasil.

“Muitas pessoas vêm comprar o Yakisoba do Bunkyo de Suzano porque é o mais saboroso de todos”, dizem com orgulho as senhoras da associação. “Justamente por ser o lugar onde tudo começou, devemos nos empenhar para manter essa tradição”, dizem em unanimidade.

“O segredo do sabor é sem dúvida o molho”. O caldo à moda de Suzano é feito com osso de porco e boi e carcaça de galinha, onde se acrescentam os legumes e tudo é cozido lentamente durante um dia inteiro. Outro ponto importante está no macarrão soba que é grelhado na chapa de modo que fique crocante e pegue cor na medida certa.

Segundo o sr. Masachika Takagi, 69, natural de Nagasaki, “as despesas são poucas e temos mais de 60% de lucro, o que é uma grande ajuda para as atividades do Bunkyo” e finaliza com orgulho: “Saber que o Yakisoba, que começou em Suzano e se espalhou por todo o Brasil é uma comida que todos apreciam, deixa-nos muito felizes”.

Nota da tradução

1.“koronia” (colônia) termo usado em japonês para designar a coletividade nipo-brasileira.

 

* Esta matéria foi originalmente publicada no jornal Nikkey Shimbun, edição de 23/06/2017.

 

* * * * * 

O nosso Comitê Editorial selecionou este artigo como uma das suas histórias favoritas da série Itadakimasu 2! Um Novo Gostinho da Cultura Nikkei. Segue comentário.

Comentário de Shigeru Kojima

Foi-me dada a oportunidade de ler os dois artigos em japonês para o Itadakimasu 2! Um Novo Gostinho da Cultura Nikkei. Apesar de terem sido apenas dois os trabalhos inscritos, a sua leitura foi profundamente interessante e muito difícil a escolha da história favorita, pois ambas primam pelo conteúdo e pelo conhecimento que seus autores têm da comunidade nipo-brasileira. De um lado, a matéria sobre o berço do Yakisoba no Brasil e, de outro, o artigo que discorre sobre o prato representativo da culinária brasileira que é a Feijoada e sua estreita ligação com o kenjinkai. Minha escolha recaiu sobre a primeira história – Suzano se orgulha por ser o berço do Yakisoba – Pastifício Hirotani e Bunkyo juntos na divulgação pelo Brasil de Kohei Ohsawa, que considero estar mais próxima do tema Um Novo Gostinho da Cultura Nikkei.

O autor pesquisou sobre o local de origem do yakisoba, o prato japonês que se tornou conhecido dos brasileiros em geral, indo até a cidade de Suzano e coletando informações no Bunkyo (Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa) local, na Associação de Senhoras e também no Pastifício Hirotani Seimei. Através desse relato detalhado, pude me convencer de que houve de fato um background favorável e, ao mesmo tempo, fez-me lembrar da versão de que foram os chineses que começaram a fazer Yakisoba na Liberdade, o chamado Bairro Oriental da cidade de São Paulo. No início, surgiram várias teorias, tornando difícil estabelecer uma evidência objetiva, mas a teoria de Suzano ser o berço do Yakisoba deve ser a mais plausível.

artigo de Masayuki Fukasawa sobre a Feijoada e sua estreita ligação com o kenjinkai também demonstra conhecimento sobre a relação do nikkei com a comida e é muito sugestivo. A tradicional Feijoada da Associação Okayama Kenjinkai é um evento que vem sendo organizado há mais de dez anos. Além de ter o atrativo de “cozinhar uma vez para retirar a gordura, temperar com sal em quantidade moderada e cozinhar lentamente para obter o máximo de sabor”, é um precioso testemunho da transmissão e transformação da cultura alimentar nikkei.

Ainda há muito que se esperar, tanto do Yakisoba como da Feijoada. Doravante, espero apreciar com muito interesse o seu desenrolar.

 

© 2017 Ohsawa Kohei; Nikkey Shimbun

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Sobre esta série

Como a comida que você come expressa a sua identidade? Como a culinária ajuda a criar laços na sua comunidade e a unir pessoas? Que tipos de receitas foram passadas de geração à geração na sua família? Itadakimasu 2! Um Novo Gostinho da Cultura Nikkei revisitou o papel da culinária na cultura nikkei.

Nesta série, pedimos à nossa comunidade Nima-kai para votar nas suas histórias favoritas e ao nosso Comitê Editorial para escolher as suas favoritas. No total, cinco histórias favoritas foram selecionadas.

Aqui estão as histórias favoritas selecionadas.

  Editorial Committee’s Selections:

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About the Author

Nasceu em 03/05/1990 em Toyoshima, Tokyo. Formou-se na Universidade Sophia Departamento de Línguas Estrangeiras Curso de Língua Portuguesa em 2013. Chegou pela primeira vez no Brasil em 2016 e atualmente é estagiário no jornal Nikkey Shimbun.

Atualizado em Dezembro de 2017

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