Descubra Nikkei

https://www.discovernikkei.org/pt/journal/2016/5/6/tatsugoro-matsumoto/

Tatsugoro Matsumoto e a magia dos jacadandás no méxico

Jacarandás na Avenida Paseo de La Reforma. Coleção Sergio Hernández

Em 1912, o prefeito da cidade de Tóquio, Yukio Ozaki, presenteou os Estados Unidos com cerca de 3.000 cerejeiras a serem plantadas na capital desse país. Nos anos seguintes, a cidade de Washington se viu inundada por milhões de flores de cerejeira que passaram a colorir toda a paisagem da capital dos Estados Unidos no começo da primavera.

Na Cidade do México, houve uma tentativa de plantar milhares de cerejeiras. Durante a sua permanência no cargo (1930-1932), o presidente Pascual Ortíz Rubio pediu ao governo japonês a doação desse tipo de árvore para que fossem plantadas nas principais avenidas da cidade como um símbolo da amizade entre os dois povos. O Ministério das Relações Exteriores japonês pediu a um emigrante que já vivia há décadas no México, Tatsugoro Matsumoto, sua opinião para avaliar a possibilidade da flor se adaptar às condições da cidade. O emigrante explicou aos dois governos que o florescer da cereja seria improvável porque exigia uma mudança muito mais abrupta de temperatura entre o inverno e a primavera do que normalmente ocorria na Cidade do México. Assim sendo, o projeto foi deixado de lado devido à experta recomendação de Matsumoto.

Tatsugoro foi um dos primeiros imigrantes a chegar no México, apenas um ano antes da primeira imigração em massa dos pioneiros japoneses para Chiapas em 1897. De fato, Matsumoto foi um dos primeiros imigrantes [japoneses] a chegar na América Latina, já que antes de ingressar no México ele havia trabalhado durante alguns anos no Peru.

Tatsugoro havia sido convidado ao país andino por Oscar Heeren para criar um jardim japonês em um dos locais mais famosos da cidade de Lima, a Quinta Heeren. Ali Tatsugoro conheceu um rico fazendeiro e minerador mexicano, José Landero y Coss, que ficou impressionado com o trabalho realizado por Matsumoto. Landero convidou Matsumoto para a sua Fazenda de San Juan Hueyapan, nas redondezas da cidade de Pachuca, para que criasse um jardim do mesmo tipo, com um lago artificial.

Após a conclusão do jardim na fazenda de Landero, Tatsugoro voltou ao Japão para visitar sua esposa, apesar de já estar com a firme intenção de se instalar definitivamente no México. Durante o retorno, ele passou um curto período nos Estados Unidos, onde trabalhou na manutenção do grande jardim japonês construído como parte de uma exposição internacional realizada em 1894 na cidade de São Francisco, no Golden Gate Park. Quando ingressou no México em 1896, Matsumoto não imaginava que nunca mais retornaria ao Japão e que morreria no México em 1955 aos 94 anos de idade.

Registro de Estrangeiro de Matsumoto. Arquivo Geral da Nação (AGN)

Na época que Matsumoto chegou no México, a Colônia Roma era um dos bairros mais elegantes da cidade e o lugar favorito onde os novos ricos surgidos durante o governo de Porfirio Diaz (1876-1911) construíam suas residências. As mansões tinham áreas ajardinadas, o que criou a necessidade de ter alguém para cuidar desses espaços. Matsumoto, sem dúvida, era o indicado para planejar e cuidar dos jardins das elegantes residências de todo o bairro; mais que um jardineiro, sua experiência era semelhante a de um arquiteto paisagista, tendo se formado em ueki-shi no Japão. Esta atividade era altamente reconhecida desde a era Muromachi (1336-1573), quando o apreciação pelos jardins, arranjos florais e cerimônias de chá levou ao surgimento dessa especialidade profissional. Posteriormente, durante o período Tokugawa (1603-1868), o crescimento das cidades e a emergência de camadas sociais interessadas no lazer e na diversão (ukiyo, ou “mundo flutuante”) permitiram a sua enorme popularidade.

Graças ao seu árduo esforço e à beleza do seu trabalho, Matsumoto Tatsugoro passou a ser apreciado pelas camadas mais abastadas da sociedade porfiriana. Em 1900, o jornal de língua inglesa Mexican Herald1 mencionou o imigrante japonês; sua fama chegou aos ouvidos do próprio Porfirio Díaz e de sua esposa, Dona Carmelita. O presidente o convidou para cuidar dos arranjos florais na residência presidencial no Castelo de Chapultepec, como também do bosque que rodeava este majestoso castelo.

Em 1910, ocorreram dois grandes acontecimentos que marcaram a vida de Tatsugoro. Em setembro daquele ano foi comemorado o primeiro centenário da independência do México. Para esta celebração tão importante, o governo do presidente Díaz convidou representantes dos governos amigos do México. O Japão enviou uma delegação de alto nível liderada pelo barão Yasuya Uchida e sua esposa; e a Liga Japonesa no México patrocinou uma importante exposição de produtos japoneses no “Palácio de Cristal”, hoje em dia conhecido como o Museo del Chopo. Ao lado do palácio, Matsumoto instalou um jardim com um pequeno lago artificial o qual foi inaugurado pelo próprio presidente Díaz e pela delegação diplomática japonesa.

No mesmo ano, Sanshiro Matsumoto, filho de Tatsugoro, chegou do Japão em busca do seu pai de quem não tinha notícias. Sanshiro conseguiu colocar em ordem a parte administrativa do negócio, da qual o seu pai não dava conta. Os dois começaram então a criar um grande empório apesar das enormes dificuldades encontradas no início do movimento revolucionário no México.

Com a estabilização da situação política após o conflito armado, a família Matsumoto recomendou ao presidente Álvaro Obregón (1920-1924) que plantasse nas principais avenidas da Cidade do México árvores de jacarandá, as quais Tatsugoro havia trazido do Brasil e que haviam sido reproduzidas em seus viveiros. As condições meteorológicas eram adequadas para que as árvores florescessem no início da primavera; além disso, Tatsugoro acreditava que as flores durariam mais tempo devido à ausência de chuva na Cidade do México naquela época do ano.

Sanshiro Matsumoto na sua estufa na Colônia Roma. Coleção da família Matsumoto

Nos anos seguintes, a família Matsumoto comprou uma casa na Colônia Roma, onde também instalaram um dos seus viveiros para reproduzir as plantas e árvores que cultivavam com grande esmero. Em 1922, a jovem Maso Matsui chegou no México para se casar com Sanshiro; ela e sua sogra abririam uma loja de flores na parte da frente da sua casa. Na loja, eram vendidos arranjos florais para festas e cerimônias de vários tipos, tais como casamentos. Nas décadas seguintes, a loja de flores ganhou fama como o lugar mais importante do gênero, onde as camadas mais abastadas da sociedade adquiriam arranjos florais únicos.

Tatsugoro, Sanshiro e dois de seus filhos na Fazenda El Batán. Coleção da família Matsumoto

As estreitas relações que a família Matsumoto mantinha com os presidentes e com os políticos importantes da República foram muito úteis nos anos seguintes, quando teve início a perseguição das comunidades japonesas que o governo dos EUA iniciou em todo o continente como consequência do seu conflito bélico com o Japão. Tatsugoro e Sanshiro se tornaram os representantes e gestores da comunidade japonesa perante as autoridades mexicanas, quando o governo decretou a concentração da população de origem japonesa na Cidade do México e em Guadalajara em 1942. Tatsugoro foi um dos que chefiaram o Comitê de Assistência Mútua, Kyoei-kai, uma organização criada pelos imigrantes para ajudar os japoneses que logo nos primeiros meses daquele ano chegaram de outras partes do México para viver nestas duas cidades. A Kyoei-kai abriu seu escritório no bairro de San Cosme, onde as famílias recém-chegadas ficaram alojadas temporariamente. No entanto, eras se tornaram tão numerosas que a família Matsumoto instalou na sua propriedade de mais de 200 hectares conhecida como El Batán (localizada onde hoje se encontra a Unidade Independência ao sul da Cidade do México), um albergue onde mais de 900 imigrantes puderam se estabelecer durante esse período tão difícil.

Mais tarde, Sanshiro, Luis Tsuji e Alberto Yoshida buscaram um lugar onde as famílias pudessem morar e também cultivar a sua própria alimentação. Foi assim que compraram uma velha fazenda perto de Cuernavaca, a Fazenda de Temixco, onde as famílias mais necessitadas puderam passar os anos da guerra, cultivando verduras e arroz. Como já havia se naturalizado cidadão mexicano, Sanshiro foi autorizado a efetuar a compra da fazenda, já que os bens e contas bancárias dos cidadãos japoneses haviam sido confiscados.

Jacarandá

Durante esses tempos difíceis, o jacarandá se reproduziu amplamente na Cidade do México e em outros lugares, ao ponto de passar a ser considerado uma árvore nativa. O conselho de Tatsugoro foi correto e visionário; por isso, hoje podemos desfrutar do nosso hanami (festa de observação das flores) com os jacarandás, os quais nos meses de março e abril florescem repentinamente como mágica, nos lembrando que Matsumoto continua entre nós.

Nota:

1. The Mexican Herald, 4 de novembro de 1900.

 

© 2016 Sergio Hernandez Galindo

agricultura arquitetura paisagística árvores de jacarandá Califórnia Cidade do México Colônia Roma El Batan Estados Unidos da América flores gerações horticultura imigração imigrantes Issei Japão jardinagem jardineiros jardins jardins japoneses México migração paisagismo Parque Golden Gate plantas Sanshiro Matsumoto São Francisco Tatsugoro Matsuno Texcoco viveiros (horticultura)
About the Author

Sergio Hernández Galindo é formado na Faculdade do México, se especializando em estudos japoneses. Ele publicou numerosos artigos e livros sobre a emigração japonesa para o México e América Latina.

Seu livro mais recente, Os que vieram de Nagano. Uma migração japonesa para o México (2015) aborda as histórias dos emigrantes provenientes desta Prefeitura tanto antes quanto depois da guerra. Em seu elogiado livro A guerra contra os japoneses no México. Kiso Tsuru e Masao Imuro, migrantes vigiados ele explica as consequências das disputas entre os EUA e o Japão, as quais já haviam repercutido na comunidade japonesa décadas antes do ataque a Pearl Harbor em 1941.

Ele ministrou cursos e palestras sobre este assunto em universidades na Itália, Chile, Peru e Argentina, como também no Japão, onde fazia parte do grupo de especialistas estrangeiros em Kanagawa e era bolsista da Fundação Japão, afiliada com a Universidade Nacional de Yokohama. Atualmente, ele trabalha como professor e pesquisador do Departamento de Estudos Históricos do Instituto Nacional de Antropologia e História do México.

Atualizado em abril de 2016

Explore more stories! Learn more about Nikkei around the world by searching our vast archive. Explore the Journal
Estamos procurando histórias como a sua! Envie o seu artigo, ensaio, narrativa, ou poema para que sejam adicionados ao nosso arquivo contendo histórias nikkeis de todo o mundo. Mais informações
Novo Design do Site Venha dar uma olhada nas novas e empolgantes mudanças no Descubra Nikkei. Veja o que há de novo e o que estará disponível em breve! Mais informações