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História nº 24: Diário da menina que queria ser japonesa (6)

12/11/2011

Querido Diário

Eu sou a Marina. Obrigada por me deixar escrever aqui. Este diário que a Jéssica escreve é tão interessante que eu li tudo. E, enquanto lia, fui percebendo que tipo de lugar é o Brasil, preciso me acostumar logo.

Estudei junto com a Jéssica na escola brasileira no Japão e nos divertíamos muito. Mas o meu pai mudou de emprego e eu tive de me mudar para longe, indo estudar numa escola para crianças japonesas. O sonho do meu pai e da minha mãe era que eu estudasse na escola japonesa. Foi muito bom na escola brasileira, mas fiquei gostando muito mais da escola japonesa.

Eu nasci em Bastos, estado de São Paulo e fui para o Japão quando tinha 3 anos de idade, com meu pai, minha mãe e meu irmão de 12 anos. Mas depois de 9 anos, meus avós por parte de mãe, que moram no Brasil e já são velhinhos, precisaram de alguém para cuidar deles.

Por causa disso, minha mãe e eu voltamos ao Brasil. Eu gostaria de ter ficado no Japão, mas tanto o meu pai como o meu irmão trabalhavam muito e eu, indo à escola, não daria conta de cuidar da casa sozinha. Foi por isso que tive de voltar para cá.

Ainda não consegui me acostumar com a vida no Brasil. No começo, estava frequentando a escola, mas como não entendo muito bem o português e não sei conversar direito, não fiz amizade com ninguém e foi ficando chato ir à escola e acabei não indo mais. Minha mãe, como estava muito ocupada cuidando de meus avós, não insistiu para que eu fosse à escola, dizendo “Então, fique em casa”.

Mas a Jéssica me deu força, pois ela é como eu, criada no Japão, veio embora para o Brasil, mas estuda direitinho indo à escola, fez muitas amizades, eu tenho mais é que aprender com ela!

Este ano não vai dar mais, mas no ano que vem quero ir à escola, estudar firme e ficar boa no português. Também vou estudar mais japonês para um dia poder voltar ao Japão. Vou me esforçar!

Jéssica, obrigada pelo incentivo, obrigada por tudo!

No Natal estarei indo a Maringá, não vejo a hora de te ver, também conhecer a sua “Obachan”!

Valeu, amiga! Beijos, Marina


23/12/2011

Querido Diário

Eba! Que bom que a Marina escreveu aqui!

Quando eu li, fiquei emocionada. E o português dela está cada vez melhor! Ela está se esforçando, né?

Sabia que a Marina vem pra cá no Natal?! A Mammy conversou com a mãe da Marina e ficou decidido assim. Claro, a Mammy vem trazendo ela.

Vou deixar o meu quarto bem arrumado para ela ver que eu trouxe muitas coisas que eu tinha no Japão, inclusive os presentes que a Marina me deu.

E tem mais uma BIG notícia: a Mammy vai se casar!

A cerimônia vai ser em março do ano que vem na igreja de Maringá. A Mammy está ansiosa para se vestir de noiva pela primeira vez na vida. Não dá nem pra acreditar!

Não que eu não acredite que a Mammy vai se casar, mas é que vai ser com o papai, não é um barato?

Os dois se conheceram na faculdade. A Mammy se formou 2 anos antes e como não encontrava emprego, resolveu ir trabalhar como decasségui no Japão. O meu pai ainda estudava, mas para ir junto, parou a faculdade e os dois se casaram na maior pressa. Quer dizer, o casamento foi só assinar papel no cartório.

A mãe da Mammy, quer dizer a Batchan de Maringá, soube do casamento por telefone e ficou decepcionada. Então, agora ela aguarda com ansiedade ver a filha se casar na igreja vestida de noiva e parece muito feliz. E pra mim ela prometeu fazer um vestido muito do lindo!

A Mammy vem pra cá no Natal e o papai no dia 31 para o Reveillón.

Como já contei, quando eu estava com 2 anos, eles se separaram e o papai voltou para o Brasil, casou com outra mulher e teve uma filha, mas logo se separaram.

Como é que é? A Mammy e o papai, que estavam separados, vão se casar de novo, um com o outro? Foi difícil de acreditar, mas isso é um assunto de adultos, e eu só sei que estou superfeliz! Vamos ser novamente uma “Família”.

Querido Diário, daqui pra frente vem só coisa boa, não acha?

F E L I Z  N A T A L!

 

© 2015 Laura Honda-Hasegawa

Brasil dekasegi ficção Nikkeis no Japão trabalhadores estrangeiros
Sobre esta série

Em 1988 li uma notícia sobre decasségui e logo pensei: “Isto pode dar uma boa história”. Mas nem imaginei que eu mesma pudesse ser a autora dessa história...

Em 1990 terminei meu primeiro livro e na cena final a personagem principal Kimiko parte para o Japão como decasségui. Onze anos depois me pediram para escrever um conto e acabei escolhendo o tema “Decasségui”. 

Em 2008 eu também passei pela experiência de ser decasségui, o que me fez indagar: O que é ser decasségui?Onde é o seu lugar?

Eu pude sentir na pele que o decasségui se situa num universo muito complicado.

Através desta série gostaria de, junto com você, refletir sobre estas questões.

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About the Author

Nasceu na Capital de São Paulo em 1947. Atuou na área da educação até 2009. Desde então, tem se dedicado exclusivamente à literatura, escrevendo ensaios, contos e romances, tudo sob o ponto de vista nikkei.

Passou a infância ouvindo as histórias infantis do Japão contadas por sua mãe. Na adolescência lia mensalmente a edição de Shojo Kurabu, revista juvenil para meninas importada do Japão. Assistiu a quase todos os filmes de Ozu, desenvolvendo, ao longo da vida, uma grande admiração pela cultura japonesa.

Atualizado em maio de 2023

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