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Gohan e Boa Sorte – Dando as Boas Vindas ao Ano Novo e a Novas Tradições

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Akemashita Omedetou. 
Xin Nian Kuai Le. 
Happy New Year & Auld Lang Syne
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É assim que damos as boas vindas ao Ano Novo na nossa família nipo-, sino-, e irlandesa-americana. Eu sou nipo-americana sansei da terceira geração, com raízes nas Montanhas Rochosas. Os ancestrais irlandeses-americanos do meu marido viajaram para a costa noroeste dos E.U.A. seguindo a Trilha do Oregon, e ele cresceu no Vale de San Fernando em Los Angeles. Nossas duas filhas são sino-americanas da primeira geração, tendo se unido à nossa família através de um processo de adoção internacional, viajando da China para o sul da Califórnia aconchegadas nos nossos braços. Com o passar dos anos, personalizamos nossas tradições de Ano Novo Nikkei-plus, começando com o oshogatsu e incorporando costumes chineses, com um toque irlandês. Eu me recordo com afeto das minhas comemorações de infância e espero que eu tenha proporcionado às minhas filhas conexões culturais similares, apoiando-as com nosso amor familiar e herança multicultural.

Okamoto/Banquete de Comemoração de Ano Novo da Família Floyd (2003) — foto de família particular

Durante a minha infância nos anos 60 e 70, as nossas comemorações de Natal e Ano Novo se tornavam uma longa festa, assando bolos, cozinhando, e comemorando com amigos e familiares. Em Denver, onde eu e meu irmão nascemos, nossa família viajava dos subúrbios até o Mercado Granada de Peixes e a loja japonesa para comprar peixe tai, polvo fresco e camarão, mochi, dashi, e os ingredientes para fazer inari e maki-sushi. Os meus pais davam a festa de Ano Novo no porão, oferecendo os quitutes, enquanto eu e o meu irmão mais novo ficávamos no andar de cima com nossos pratos de degustação da festa. Dos nossos quartos, espiávamos os convidados chegarem: os homens de terno e as mulheres em vestidos de noite e com cabelo bufante. Ficávamos na porta do porão bisbilhotando, escutando as gargalhadas e Dave Brubeck cantando “Take Five” no aparelho de som do papai. Apesar da empolgação, nós acabávamos caindo no sono bem antes da meia-noite. Passávamos o Dia de Ano Novo na casa da tia Sadami, assistindo futebol americano com a nossa família.

Fomos embora de Denver quando eu tinha 8 anos, e a cada poucos anos nos mudamos para lugares diferentes, sem acesso à comida japonesa. Ainda assim, os meus pais continuaram a seguir nossas tradições mesmo quando tinham que improvisar ou viajar centenas de milhas para encontrar ingredientes. Não importa onde morássemos – Nevada, Montana, Califórnia, ou Oregon – sempre acordávamos no Dia de Ano Novo para achar o ozoni da minha mãe, com kamaboko rosa e branco, e ouvir ela lembrando que seria má sorte comer qualquer coisa antes de compartilharmos todos juntos da primeira refeição do ano. Mais tarde, jantávamos tempura, won tons, e teriyaki. Comíamos salmão ao invés de tai, e onigiri ao invés de sushi. Eu fazia o namasu com cenoura e daikon, e torcia as rodelas de laranja em forma de cataventos. Apesar de que o sabor me fazia torcer o nariz, a minha mãe insistia que eu comesse um grão de feijão do seu prato de kuromame favorito para atrair boa sorte. Como geralmente éramos os únicos japoneses na comunidade, os meus pais apresentaram seus amigos às nossas tradições ao abrir as portas da nossa casa, convidando-os à mesa no Dia de Ano Novo.

Eu gostaria de poder dizer que dei continuidade a essa tradição culinária com as minhas filhas, mas (com todo o respeito aos meus antepassados isseis e nisseis, e com um pouco de vergonha) eu tiro proveito da arte de “comida para viagem”, uma das vantagens de morar em Los Angeles. Nos dirigimos ao [supermercado] Marukai para comprar osechi já preparado, rolinhos de primavera, e gyoza congelado, os quais são acompanhados com galinha frita do supermercado, mas tudo servido nas nossas tijelas japonesas (o que conta é a intenção e a apresentação, certo?) Ao invés de kuromame, eu sirvo delicados pretos. Para atrair sorte, brindamos com sidra e comemos talharim de soba à meia-noite e mochi ao nos levantar. Eu preparo ozoni para mim mesma; forço o meu marido a provar o mochi coberto de açúcar e shoyu, e esquentado no fogão de microondas; e deixo minhas filhas comerem mochi recheados com sorvete. Os únicos outros pratos feitos em casa do menu da minha mãe são namasu e gohan. Nosso kagami-mochi e kadomatsu decoram a mesa da entrada e lembro as minhas filhas, repetindo o que a minha mãe dizia anos atrás, de se comportarem exemplarmente para assim abrirem as portas para um bom ano.

Então transicionamos para o Ano Novo Chinês, o qual começamos a comemorar em 1997, com a adoção da nossa primeira filha. Para honrar a herança cultural da nossa filha, eu consultei meus amigos chineses e pesquisei como incorporar novos costumes (e aprendi a história das minhas práticas japonesas também). Atualmente, nossas comemorações tem início antes do Natal, quando decoramos uma árvore especial com ornamentos asiáticos que colecionamos, incluindo cegonhas de origami, bolinhos da sorte, bonecas kokeshi, e animais do zodíaco chinês. Com todo o prazer, eu adio a limpeza da casa até depois de 1º de janeiro e antes do Ano Novo Chinês.

Na semana anterior ao Ano Novo Chinês, visitamos Chinatown para comprar guloseimas e decorações especiais para a nossa casa – galhos de ameixeiras, bambus da sorte, lanternas, e poemas chineses. Quando as minhas filhas eram pequenas, andávamos pela Rua Broadway procurando por conjuntos de vestidos tradicionais qipao vermelhos, e nos deleitávamos com bao assado no forno.

Em casa, uma tijela de laranjas mandarinas toma o lugar do kagami-mochi para chamar prosperidade. Também penduramos o caractere para sorte (fu) de cabeça para baixo na nossa porta de entrada para atrair boa sorte. Na véspera de Ano Novo, nos reunimos em um jantar de família composto de pratos de restaurante, incluindo peixe (yu) simbolizando o sentimento de união, talharim longa vida, salada de galinha chinesa, e frango com molho de laranja do Panda Express. Antes de ir para cama, nossas filhas murmuram palavras de apreciação ao seu pai e a mim para então receberem seus envelopes hong bao vermelhos, com alguns dólares contidos neles.

Como contraste ao nosso pacato Ano Novo Japonês, as nossas comemorações do Ano Novo Chinês duram semanas. Há 12 anos, eu e duas amigas, também mães, coordenamos os banquetes de Ano Novo da associação de famílias adotivas Famílias com Crianças da China – eventos gigantescos em Chinatown, reunindo mais de 1.500 adotados, pais e convidados, com uma refeição de 10 pratos, dançarinos do leão e do dragão, e acrobatas. Festejar com suas “Irmãs Chinesas”, desfilar na Parada do Dragão Dourado, e me ajudar nas preparações do banquete – desde embrulhar prêmios para o leilão-sorteio até dobrar guardanapos e colorir números nas mesas – se tornou uma tradição da nossa família adotiva e o ponto alto do ano.

A temporada termina com o Festival das Lanternas, quando nossa família contempla a lua cheia, reza com gratidão ao pedir um ano novo de felicidade e saúde, e compartilha bolinhos de massa jiao zi (de novo, gyoza congelado).

Depois de guardarmos as decorações das festas asiáticas, nós pegamos os trevos e servimos biscoitos amanteigados, celebrando assim o Dia de São Patrício, nos vestindo de verde e homenageando os nossos ancestrais, não importa de que parte do mundo vieram. Adicionamos a “sorte dos irlandeses” aos nossos pedidos de boa sorte das festas de Ano Novo japonês e chinês, ao servir um jantar com guizado irlandês (feito em casa por mim mesma!) com gohan, tortellini recheado com espinafre, e cupcakes cor de esmeralda como sobremesa. Então começam as preparações para a nossa Páscoa nikkei.

* * *

Minhas filhas agora são adolescentes. Elas preferem sushi do que dim sum, mas misturam e combinam costumes. Apesar de termos adicionado o nosso toque familiar às tradições, o tema unificador da nossa mistura anual de rituais é a herança cultural que adotamos: pertencer a uma comunidade e a nós mesmos. Brindamos com gratidão o fato de sermos uma família – um espírito que alimentamos no decorrer do ano.

 

Brindamos o brilhante ano novo

E um caloroso adeus ao que passou.

Brindamos as coisas que estão para vir

E as memórias que trazemos.

Uma Prece Irlandesa

 

© 2013 Jeri Okamoto Floyd

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Sobre esta série

Ser nikkei é intrinsecamente uma identidade com base em tradições e culturas mistas. Em muitas comunidades e famílias nikkeis em todo o mundo, não é raro usar tanto pauzinhos quanto garfos; misturar palavras japonesas com espanhol; ou comemorar a contagem regressiva do Reveillon ao modo ocidental, com champanhe, e o Oshogatsu da forma tradicional japonesa, com oozoni.

Atualmente, o site Descubra Nikkei está aceitando histórias que exploram como os nikkeis de todo o mundo percebem e vivenciam sua realidade multirracial, multinacional, multilingue e multigeracional.

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About the Author

Jeri Okamoto Tanaka é uma nipo-americana da terceira geração cujos pais nasceram e foram criados numa área rural no estado de Wyoming. Seus textos são inspirados nas histórias de sua família, sua infância no Colorado, Nevada, Montana, Oregon e Califórnia, e suas experiências como mãe adotiva e voluntária da comunidade. Ela faz parte do conselho do Centro de Atendimento de Little Tokyo [no centro de Los Angeles] e é Conselheira e Coordenadora para Pais no Programa de Mentoria China Care Bruins [o qual oferece assistência a jovens de origem chinesa] na UCLA. Ela mora em Los Angeles. Seu trabalhos foram publicados na revista Adoptive Families, no site Joys of Christmas (parte do site Guidepost), The Sun, Loyola of Los Angeles Law Review, Journal of Families with Children from China, OCA Image, UCLA Chinese Cultural Dance Dragonfly Quarterly, na publicação “Care Package” da Fundação China Care, e no livro Kicking in the Wall:  A Year of Writing Exercises, Prompts & Quotes to Help You Break Through Your Blocks and Reach Your Writing Goals [“Chutando o Muro: Um Ano de Exercícios Escritos, Sugestões e Citações para Ajudá-lo a Romper Seus Bloqueios e Alcançar os Seus Objetivos como Escritor”].

Atualizado em setembro de 2015

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