Para mim, escrever é um ato de pura alegria. Ao longo desses anos todos, viver tem sido algo gratificante porque para mim sempre existiu a escrita, motivo maior e incentivo para seguir em frente.
Criancinha ainda, eu vivia rabiscando na parte inferior do guarda-louça de casa. Do lado de dentro, que era para ninguém ficar espiando. Ainda conservo na memória a série de desenhos e garranchos que, para uma criança, certamente teria representado uma porção de histórias espetaculares.
E quem me ensinou as primeiras letras foi meu pai. Eu ainda não estava na escola, mas todo dia eu tinha como lição escrever o meu nome completo e algumas palavras fáceis.
Quando aprendi a formular frases, meu prazer era escrever cartas às amiguinhas e aos primos do interior. Eu não me importava se eles respondiam ou não, eu queria era escrever. Aliás, mesmo hoje eu escrevo cartas e envio mensagens por e-mail, sem a expectativa de que os destinatários me retornem uma resposta.
Foi no curso primário que comecei a escrever versos. Meu primeiro poema tinha por título “Para onde vou” e, confesso, não tinha muito sentido. Mas quando me tornei estudante colegial, meus temas foram ficando sérios e com isso fui selecionada num concurso nacional de poesia.
Lembro também que fazia um jornal todo manuscrito, sem a ajuda de ninguém. Chamava-se “A gavetinha”. Desde o editorial, passando pelas notícias, anúncios, histórias em quadrinhos, tudo era feito com dedicação e carinho. Muito tempo depois, eu já era professora, quando passei essa técnica do jornal manuscrito aos meus alunos e dentre eles houve um que se saiu tão bem que vendia os jornais que fazia aos amigos e vizinhos.
No colegial virei poeta e escritora por encomenda. Tinha que atender os muitos pedidos das colegas que encomendavam algo para mandar aos namoradinhos. Haja inspiração para escrever tantas coisas melosas para tantos garotos que eu nem conhecia!
Os quatro anos passados na faculdade foram de total obscuridade, limitando-me aos trabalhos de pesquisa, monografias e coisas afins.
Como bolsista no Japão, colaborei com frequência no jornal dos bolsistas brasileiros.
De volta ao Brasil, escrevi inúmeras matérias sobre a cultura japonesa que foram publicadas nos principais órgãos de imprensa nikkei.
Como professora de língua portuguesa e literatura brasileira, passei 30 anos escrevendo quase que diariamente. Eram textos para uso nas aulas, peças de teatro para apresentação dos alunos no Festival Cultural, além de matérias para o jornal da escola.
Em 1991, realizei meu sonho com a publicação de meu primeiro livro, “Sonhos bloqueados”, que teve ótima receptividade. Graças a ele estive visitando diversas cidades de São Paulo e outros estados, conhecendo um grande número de pessoas.
Seguiram-se mais três livros, que são como filhos que criei para o mundo. E, a cada lançamento, vinham pedidos e sugestões: “Por que não escreve em japonês também?”.
Sempre tive vontade de escrever em japonês, mas me faltavam coragem e confiança.
Mas tudo mudou depois de uma viagem que fiz ao Japão em 2005.
Lá, pude reencontrar uma pessoa que havia conhecido 33 anos antes e de quem não tinha notícias desde então! Foi um milagre e a partir desse momento entendi que teria de escrever em japonês, pois essa era a única língua comum para nós dois.
Com a troca constante de e-mails com essa pessoa, comecei a me interessar pelo idioma japonês cada vez mais, e fui tomando coragem e ficando confiante. E assim começou minha grande aventura no complexo mundo das letras japonesas. Mas devo confessar uma coisa: se não fosse o processador de texto Word para o japonês, a minha escrita estaria avançando a passo de tartaruga!
Outro dia, ganhei de uma amiga um livro muito interessante em japonês. É um dicionário de onomatopeias. A língua japonesa é rica em onomatopéias! Fiquei tão motivada que fiz um poema e como as onomatopeias são muito interessantes, preferi conservá-las na língua original.
Mas se você quiser sentir o quão pitoresco é, tente ler em japonês também.
Meu primeiro encontro
Domingo... Como estará o tempo?
Se zaa zaa chover Chato não?
Pois é o meu primeiro encontro
Mas pode ser romântico né?
Chove chuva shito shito
Brilham os olhos kira kira
Coração bate forte doki doki
Nós 2 meio que sem-graça
Debaixo de 1 guarda-chuva
Domingo... Será de calor?
Kan kan que sol abrasador
Arde a pele hiri hiri
Kara kara seca a garganta
Que horror!
Mas pode ser divertido né?
O céu a perder de vista
Uki uki Passeando nas nuvens
Nós 2 só sorrisos
Nosso primeiro encontro
Chega domingo
Sowa sowa desassossego
E o telefone que não toca!!!
Trim triim!
Hiya hiya suando frio
“Alô...
O treino tava puxado!
Heto heto não dá viu
Desculpa”
Essa não! Decepção!
Tarde de domingo
Na frente da TV
Poti dorme suya suya
E eu embuRRada
Janela afora
Pikka~ Pikka~
Goro goro
É a tempestade de verão
Assim está meu coração.
E a alegria que tenho ao escrever, que começou com as garatujas na porta do guarda-louça lá de casa, parece que vai continuar...